Dos nossos dias comuns...

19:19

Recordo nesse instante, das breves e intensas lembranças, dos nossos dias comuns. A vida inteira esperei um príncipe a cavalo, que viesse me libertar da minha clausura interior. Ah, boba menina. Com o passar do tempo, aprendi e entendi que o meu 'príncipe' não viria a cavalo; certamente eu encontraria um homem como qualquer outro, com uma rotina - trabalho, estudo, afazeres, lazer - como uma pessoa qualquer. Nada especial, apenas ele. Passei anos à espera desse homem, desse amor, até que um dia o encontrei.
Entrava em um elevador para o trabalho, quando o vi. Parei imediatamente. Não, ele não era o homem mais lindo do mundo, mas me encantou de forma repentina e imediata. Parou à minha frente, e gentilmente segurou a porta para que eu entrasse. Dentro do elevador, aquele silêncio mórbido, mas dentro de mim tudo se remexia, revirava. Um misto de sentimentos e sensações que eu nunca havia experimentado. Até que um espirro, dele, quebrou o silêncio. Educadamente desejei-lhe saúde - costume bobo e sem sentido que todo o mundo acaba o repetindo. Mas foi apenas isso, para que uma longa conversa iniciasse, afinal estávamos em uma longa 'viagem' do térreo até o 68º andar. Começamos com trivialidades do tipo: O que faz aqui? Nunca lhe vi por aqui... Quanta bobagem! Mas foi assim que descobri que ele dava início ao trabalho naquele dia, e no mesmo prédio em que eu trabalhava?! Ok destino, muito obrigada! Nos despedimos naquele dia com um belo sorriso e os tradicionais dois beijinhos de cumprimento, quando o elevador parou no 52º andar, onde ele trabalharia.
Não preciso dizer que passei o resto do dia pensando nele, não é? E foi um dia chato, porque nada prendia minha atenção, apenas a lembrança daquele sorriso sutil, discreto, mas o mais lindo que já havia visto. Desejei encontrá-lo, com toda a força do universo. Apelei, e como apelei, mas o destino estava ao meu favor. Naquele dia, de forma incomum, larguei mais tarde, pois tivemos uma reunião de urgência no escritório, e saí por volta das 20 horas. Ao atravessar a rua, quem eu vejo, do outro lado? Mal pude me contar, e acenei (confesso que de forma exagerada). Ele, retribuindo minha euforia, também acenou e me chamou. Me deu um longo abraço - o que me surpreendeu magicamente - e disse que desejava me encontrar novamente desde que entrou em seu escritório. Não me contendo, mais uma vez, afirmei que esse também havia sido o meu desejo durante todo o dia. Me convidou, então, para um café e obviamente aceitei. 
Passamos horas naquele café da esquina, conversando mais trivialidades, podendo conhecê-lo da forma mais simples e mais verdadeira. Conversamos sobre os nossos gostos, desejos, sobre um pouco da história de cada um. E paramos quando chegamos ao ponto de 'o que havia nos levado a chegar onde estávamos naquele momento'. Sem respostas, acreditando no destino, nos aproximamos, e nos beijamos. Um beijo calmo, mas intenso, caloroso, com gosto de café e chantilly. Delicioso, em todos os sentidos. Minha barriga deu uma volta, parecendo ter algo voando dentro dela. Que emoção! Desde ali, tenho certeza, eu já estava apaixonada. Afinal, eu não era tão popular a ponto de estabelecer uma relação tão amigável, em tão pouquíssimo tempo. Eu não sabia o que nos aguardava, mas tinha certeza de que estávamos sentindo a mesma coisa.
A partir desse dia, comecei a receber telefonemas de 'Bom dia', mensagens apaixonadas, do tipo 'Acordei pensando em você e percebi que estou apaixonado, de novo a cada dia'. O que mais eu poderia pedir? Acho que nada, não é? Vivemos dias intensos, como manda a paixão. Tudo não nos cabia, de tanto que nos preenchia. E aos poucos, a calma foi nos tomando, e a intensidade foi dando espaço para a leveza. Era o amor tomando conta de tudo o que era nossas vidas. Vivemos longos meses, juntos, nos amando a cada dia. Entre flores, perfumes, chocolates, jantares, cafés da manhã surpresa, pelúcias... Fomos fortalecendo o laço que nos unia. Mas acima de tudo, nos dedicávamos a esse amor, com respeito e verdade.
Já éramos membros comuns de nossas famílias, não havia nada a esconder de ninguém. Compartilhávamos nossos apartamentos, entregávamos nossas vidas um ao outro, e mais uma vez o destino nos empurra e esfrega na cara, que não fazia sentido estarmos cada um no seu espaço, e que era o nosso caminho, estarmos  juntos. Estávamos numa joalheria, onde eu comprava pequenos mimos desde minha adolescência, quando comecei a trabalhar, e o vendedor fala: - Os pombinhos desejam ver as alianças? Chegaram algumas hoje, e são lindíssimas. João abriu um lindo sorriso, e respondeu: - Só se a linda moça aqui, quiser ser minha noiva. E olhou pra mim com olhos de verdade, e imediatamente danei-me a chorar. Não cabia em mim tanta emoção. Escolhemos nossas alianças, ele entre sorrisos e eu entre lágrimas. Que cena boba! Mas o amor nos deixa bobos mesmo.
Marcamos um jantar para poucas pessoas. Convidamos nossos pais e alguns amigos, e comunicamos nosso noivado. Mas, ele ainda queria me surpreender mais - e eu nem imaginava que isso fosse possível - pois naquela mesma noite, anunciou a data de nosso casamento. Eu não sabia de nada, e fiquei desnorteada de tanta felicidade. Até nos meus mais loucos sonhos, nunca imaginaria que minha vida seria assim, tão bonita. Desse diante em diante, era uma loucura lidar com tanta informação, tantos detalhes... Porque ele havia marcado o casamento com um curto espaço de 2 meses. Mas ele não me deixava fazer nada só, estava comigo em cada escolha. Construíamos, de fato, uma vida em comum. 
No dia do nosso tão sonhado enlace matrimonial, tudo passou tão sorrateiramente que eu tinha a sensação de que a hora não chegaria nunca. Mas depois de tanta espera, tantos preparativos, eram 17 horas e o parque estava todo preparado para receber-nos, felizes e dispostos a vivermos juntos por toda a eternidade, como propõe o juramento que fazemos ao nos casarmos. E cumprimos, perfeitamente, tudo o que deveríamos. O Sim saiu quase que como um desabafo, de tanta ansiedade. A sonhada hora do 'Pode beijar a noiva' nos fez dar uma bela gargalhada. Éramos, enfim, divinamente um do outro. Cumprimos tudo o que nos cabia, e nos sentíamos felizes. Ele me olhava com olhos de doçura, e eu correspondia com olhos de encanto.
Tudo o que vivemos depois disso, foram coisas comuns. Dias comuns, pessoas comuns, amor comum. Mas o comum não era mórbido, não era rotina. Era essência. Sem exageros, apenas com o essencial. Vivemos compartilhando cada conquista, cada anseio, cada projeto, cada preocupação. Evoluímos consideravelmente, e 1 ano depois eu descubro estar à espera do nosso primeiro filho. Foi uma surpresa, mas ambos desejavam um fruto de um amor tão grande. Cuidamos de cada detalhe da espera do nosso primeiro fruto. Em alguns meses, descobríamos que era uma menina, e de uma forma imediata, olhamos nos olhos um do outro e falamos: Cecília! Sim, esse era o nome que havíamos escolhido para o caso de termos uma menina. Nossos olhos refletiam o encanto dessa criaturinha, que ainda nem conhecia o mundo, apenas o meu útero, onde o nosso amor germinava a linda semente. Tínhamos apenas 23 anos, ambos, quando Cecília nasceu. Mas nossa juventude nos deu a maturidade que precisávamos para lidar com um ser ainda tão pequeno, que necessitava de tantos cuidados, em tantos detalhes. Alimentávamos a nossa vida com a presença da nossa pequena. A cada novo dia, a cada nova experiência, seja ela da troca de fraldas, do banho, até o balbuciar das primeiras palavras, confirmava que aquela era a minha felicidade.
E a vida foi tomando forma. Crescemos, nos amamos a cada dia. Amamos nossa filha. E descobrimos que com o passar do tempo o amor não se desfaz. Hoje, com 30 anos, já não somos tão apaixonados. Tenho saudades dessas lembranças comuns. Mas, o que vivemos hoje é o suficiente para que tenhamos sempre, a certeza de que nascemos sim, um para o outro. O amor que encontramos, que construímos, solidifica nossas esperanças. E cada dia, é sempre um motivo a mais, para amarmos um ao outro, e à nossa pequena Ceci. 
Dedico essas memórias, ao homem que fez e faz a minha vida, fazer mais sentido. E á nossa menina, que nos une mais, a cada dia.
Com amor, Maria Flor.


Magda Albuquerque

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