Soco no estômago
22:57
Nada poderia ser mais insensato naquela quinta feira, do que sair e encontrar você. Mas encontrá-lo feliz, ao lado dela. Me senti má, egoísta, triste, agoniada. Tanta coisa.
No meio do caos, o trânsito infernal, os infinitos carros a passar, não me impediram de olhar o outro lado da rua e vê-lo passeando livremente, como se nunca houvesse machucado coração algum. Pensei em gritar, correr, voltar para casa, voltar para minha cama, e não sair tão cedo. Mas precisava enfrentar aquele dia.
Aquela imagem, tanta felicidade do casal, não saíram da minha cabeça o dia inteiro. Não, eu não poderia pensar em você com tanta raiva, e ainda lhe amar. Não havia razão para ainda nutrir qualquer sentimento por você. Estava confusa.
Mas aquela sensação foi como um soco no estômago, com toda a força. Lembrei do fim daquilo que um dia chamamos de relacionamento. Lembrei de todas as mentiras, e todo o sofrimento que me fez passar. Como poderia, então, logo você, parecer tão feliz, leve? E eu permanecendo um lixo, um caos prestes a eclodir em uma crise.
Não, eu não me conformei. Precisava fazer alguma coisa. Precisava transbordar as verdades engasgadas por tantos anos. Anos a fio, em meio a uma solidão desconfortante, com a confiança completamente fragmentada. Você me devastou.
Depois de um dia confuso de trabalho, sem concentração alguma para elaborar pautas de reuniões, enfim cheguei em casa. Joguei tudo ali mesmo, na porta e corri para o computador. Abri o correio eletrônico e resolvi que era chegada a hora de lhe dizer tudo. Novo e-mail.
Escrevi cada linha embalada entre lágrimas e soluços. Enfim minhas dores encontraram um lugar para desaguar. Enfim pude lhe culpar pelo desastre que se tornou minha vida, meus amores não vividos depois de tudo o que você me fez. Páginas e mais páginas, repletas de mágoas e angústias. Toda a verdade em palavras. Ao final, senti alívio, por finalmente desabafar, depois de longos e tortuosos anos. Minha infelicidade compartilhada por quem a causou, e eu deixei. Agora você saberia cada detalhe, cada ferida, cada tortura, cada mentira e traição que seguiram nossa história. O soco no estômago me fez vomitar todas as verdades guardadas, sem crivo algum.
Ponto final. Enviar e-mai. Confirmar.
Faltou coragem. E aquelas palavras permaneceram ali, guardadas. Mas não mais comigo. Talvez fosse apenas isso. Ao menos foi o suficiente... Por ora.
Magda Albuquerque
* Texto escrito pro #todoscomenta do Elite!
4 comentários
Gostei do texto. Me identifiquei bastante, rs.
ResponderExcluirBjs
É curioso como nesses momentos de dor e solidão algumas palavras precisam ser ditas por nós, só que para nós mesmos.
ResponderExcluirBelo texto! A narrativa ficou em sintonia incrível com o título.
Um abraço!
É incrível o poder da escrita nas nossas vidas, né, Magda? Mesmo que o e-mail não tenha sido enviado, escrevê-lo causou um grande alívio. Como você mesma descreveu, fez ''vomitar''todas as verdades, aliviar.
ResponderExcluirEnfim, texto maravilhoso. Quem ama escrever e precisa disso tanto quanto o ar se identifica, não tem jeito.
Beijo!
Vejo o texto como uma perspectiva dolorosa - porém necessária - de superação.
ResponderExcluirUma proposta superior de lidar com os infortúnios do passado a ponto de não prejudicar a nova felicidade daquele que um dia nos fez algum mal.
Certamente que a vingança alimenta e estimula nossa gula por justiça, mas às vezes, é só a dor solitária que nos impulsiona.
Bela descrição.